*Escrito por Ivonei Peraça e ilustrado por Wagner Passos
Fazer um livro ilustrado é um grande desafio. Não adianta simplesmente criar imagens que reproduzam o que está escrito no texto, esta é uma lógica que não acrescenta informação para a imaginação do leitor. É preciso criar algo a mais, uma narrativa paralela ao texto por meio dos desenhos, assim como transmitir emoção, ação e sentimentos. Ou mesmo propor um novo texto, o chamado texto não verbal, que constitui uma outra abordagem para a mesma história. No caso de um livro para crianças, pode ser lido por elas sem estarem ainda alfabetizadas. Mas o mais bacana de tudo é o compromisso, não só com uma qualidade estética, mas com o impacto esperado pelo leitor, a fim de causar surpresa em cada página virada. Ou seja, um livro ilustrado é quase uma reprodução da própria vida, cada página um dia, que não sabemos como será e nos perguntamos: O que virá?
Eu e o pai temos nosso método de trabalho. Respeitamos bastante a arte um do outro, com a liberdade de cada um palpitar no que o outro faz (obviamente, depois de rabiscado e o trabalho inicial encerrado), a fim de melhorar, mostrar uma perspectiva diferente e desenvolver a obra de maneira mais harmônica, tanto para nós artistas, quanto nossa percepção para o leitor. Mas partimos sempre de uma ideia e na sequência, a produção de um texto bruto, que aos poucos vai ser lapidado e melhorado.
"A Miraguaia e o Pescador" surge dessa nossa busca por histórias e ícones da nossa natureza e região. Uma forma de produzirmos obras cujo público local, que é a maioria dos nossos leitores, possa se identificar e criar reflexões e sentimentos de pertencimento e conhecer a natureza que nos circunda e a nossa própria história. Uma cidade com quase 300 anos e tanta riqueza ambiental, impactada pelas grandes indústrias de fertilizantes, porto, agrotóxicos e extremamente poluída. Um trabalho que acaba tendo como maior público professoras do ensino fundamental, que utilizam nossas obras como material de apoio didático. E assim, estas ideias, reflexões e conhecimentos chegam de outra forma, por meio da literatura, em crianças, jovens e adultos.
A escrita do pai é livre, sem medo de riscar, de erros, de criar uma ou outra frase por cima. A história parte de uma ideia que vai sendo composta. Esse é o processo criativo dele, ocorrendo espontaneamente, da vontade e inquietude de escrever. E aqui trago a primeira e última página do texto original de "A Miraguaia e o Pescador", iniciado exatamente no dia 17 de novembro e terminado um mês depois, no dia 17 de dezembro de 2023. Uma história que nasce da percepção da necessidade de lembrar e falar desse peixe que pode chegar a 50kg, viver 50 anos, bastante conhecido em nossa cidade pelos pescadores artesanais e amadores até os anos de 1980, mas que a pesca industrial predatória e a poluição fez desaparecer.
A partir desse texto vamos (embora já começam a ser imaginadas as ilustrações), lapidar o texto até criar a sua versão final, sentindo o clima, a musicalidade, tempos verbais e palavras, ou mesmo desenvolvimentos de outras linhas do enredo que podem abrir espaço para determinados rumos mais interessantes e não previstos inicialmente. Isso tudo também inclui excluir partes que destoam demais e que causariam estranheza.
Ou seja, um livro não nasce pronto e exige muito trabalho, pesquisa, análise e estudo sobre a ideia, história e o próprio texto.
Esta é a primeira postagem de uma série, a qual tentarei mostrar todo o processo dessa publicação, lançada na 49ª Feira do Livro da FURG e disponível nas livrarias Vanguarda, Albuquerque, Hippocampus e nos sites da Magazine Luiza e editora Yaguarú.
Um grande abraço!
Wagner Passos